terça-feira, 9 de março de 2010

Iára.

Lembra quando criança?
Eu sei que você deve lembrar, você tem que lembrar, a sua doença não afetou sua memória, não é? Eu sei que não. Pessoas zombando de mim, você estava lá comigo. Junto de mim.

Você latiu.
Eles correram.

E o tempo passou, entre palmadas, cadeiras, sapato, roupas estraçalhadas, restou um garoto que cresceu, mas nunca te abandonou. Ele cresceu, você também, ele certamente viverá um bom tempo. Mais e você? E você? Só tem quinze anos, ainda é uma adolescente.
Quando criança, eu pensava que você estaria lá, na minha nova família, com meus filhos, minha mulher. Eu errei contigo, teve um tempo que te deixei de lado.

Meu Deus. E você sempre esteve lá, eu te esnobando e você lá. Como pode? Como pode?
E eu agora digo.
- Como pude? Como pude fazer isso?

Arrependo-me, choro e sinto falta. Você estava ali deitada, calma, serena, esperando... Esperando o pior. Esperando o pior pra nós, que no momento é pior pra mim. Eu passo perto de você e você ergue o olhar com um jeito triste, me dizendo tchau. Hoje sentei do seu lado, ontem também. Dois dias pra quem merece cada milésimo da minha atenção. Queria que você pudesse ler isso, olhe pra mim, olhe. Tente ler o que em meus olhos, tente ver o que essa lágrima de agora transmite, por favor?

Levante a cabeça, deixe eu fazer cócegas na sua barriga ou na sua orelha. Late pra mim, por favor, agora.
Você que era a gulosa, que acabava primeiro de comer só pra ir pegar a ração dos outros. Você que sempre era esperta, se curvou, deu um tempo, um tempo definitivo nessa esperteza.

Cadê meu quarto sujo?
Cadê?
Cadê as madrugadas sem dormir, porque você não parava de latir?
Cadê?
Cadê você pulando no portão, fazendo barulho, só pra que eu pudesse ir lá e... te olhasse.
Cadê?
Cadê você com medo dos trovões, da chuva, até mesmo dos fogos de Natal e Ano Novo.
Cadê?

Você ainda está aqui, mas você quer partir, não é? Eu te deixo ir... Só não se esqueça de mim, não esqueça não, minha mamute, minha bruta, minha safada, meu amor. Meu cão. A sua família, sentirá saudade.

Sim.
Sentirá.
Fique com Deus. Eu amo você!

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